Qualquer pessoa com epilepsia que não tenha controle adequado de suas crises, mesmo com o uso regular de medicamentos antiepilépticos pode procurar ajuda a um centro especializado em epilepsia.

A investigação minuciosa num centro de epilepsia está indicada principalmente em 2 situações:

- Nos casos onde há dúvidas quanto ao diagnóstico de epilepsia.

- Nos casos de epilepsia de difícil controle que possam beneficiar-se de tratamento cirúrgico

A investigações inicial é convencionada internacionalmente como FASE I da investigação:

 

FASE I

A parte mais importante da investigação da FASE I é a monitorização contínua do paciente por VÍDEO-EEG.

O paciente é admitido na Unidade de Vídeo-EEG e eletrodos são colocados sobre o couro cabeludo, como na realização de um EEG habitual. Ao mesmo tempo, uma câmera colocada na unidade de Vídeo-EEG grava as atividades do paciente, inclusive as crises. O regitro simultâneo do EEG e Vídeo é contínuo, 24 horas por dia.

Uma análise criteriosa do EEG do paciente quando está sem crise (EEG interictal) ou durante uma crise (EEG ictal) pode fornecer evidências de difunção elétrica cerebral focal. Embora certas anormalidades (espículas e complexos de ondas lentas) detectadas no EEG interictal têm alguma importância na localização da origem das crises, o registro concomitante de EEG com vídeotape durante a ocorrência espontânea de uma crise é muito mais importante. Atualmente dispomos de sofisticados softwares e hardwares que detectam automaticamente as atividades epileptiformes interictais e alterações eletrográficas ictais, que eventualmente possam passar despercebidas.

As alterações eletrográficas mais importantes para a detecção do foco ou dos focos (o local onde se originam as crises) são aquelas registradas bem no começo das crises, antes que haja um espalhamento da crise para outras regiões do cérebro. Se após registrar um certo número de crises e as alterações eletrográficas do início das crises apontarem constantemente para uma determinada região do cérebro, provavelmente esta região é a responsável pelas crises (zona epileptogênica).

Os pacientes permanecem internados em média 3 a 4 dias na Unidade de Vídeo-EEG e frequentemente têm suas medicações reduzidas para facilitar a ocorrência e consequentemente o registro de crises.

Outros exames que podem ser realizados (depende de cada caso) durante a FASE I são:

-Avaliação Neuropsicológica

- Ressonância Nuclear Magnética do encéfalo

- Spect

Avaliação Neuropsicológica

Através de uma série de testes, a neuropsicóloga avalia as diversas funções do cérebro e detecta as eventuais alterações da linguagem e da memória do paciente, permitindo sugerir qual ou quais áreas envolvidas na origem das crises. Os testes ainda avaliam as funções do cérebro de uma forma global.

Ressonância Nuclear Magnética do encéfalo (RNM)

A RNM é o método diagnóstico não invasivo que usa campos magnéticos para visibilizar e analisar as estruturas do corpo. Justamente por usar campo magnético, a RNM não oferece os riscos de radiação.

A RNM é extremamente sensível e pode mostrar com excepcional detalhe, anormalidades do cérebro. É um exame extremamente útil na avaliação do paciente com epilepsia.
O exame demora em torno de 45 minutos para ser realizado.
A realização ou não da RNM durante a FASE I depende se o paciente já tiver feito RNM previamente ou não.

SPECT (Single photon emission computerized tomography)

Ou Tomografia Computadorizada através de Emissão de um Único Fóton.

É um exame especial para estudar o fluxo sanguíneo de diversas regiões do cérebro. O exame consiste na injeção de uma pequena quantidade de substância radioativa (que não causa mal para o organismo) na veia durante uma crise (Spect ictal). Após algumas horas o paciente é levado para o Centro de Medicina Nuclear para verificar a distribuição desta substância nas diversas regiões do cérebro. Muitas vezes há uma maior concentração da substância na região do cérebro onde a crise se iniciou (denotando o provável foco da crise).

O Spect realizado fora das crises (Spect interictal) geralmente mostra uma captação normal ou diminuida desta substância.

Após o término dos exames da FASE I, geralmente pode-se obter as seguintes conclusões:

- Se o paciente realmente apresenta crises epilépticas ou pseudocrises (simulação de crise).

- O diagnóstico do tipo das crises e consequentemente o tipo da epilepsia que o paciente apresenta.

Se o paciente for internado para o diagnóstico, ele retornará ao seu médico de origem com o laudo constando as conclusões dos médicos do Centro de Epilepsia.

Se o paciente for internado para avaliação pré-cirúrgica, três situações podem ocorrer:

1) A região do cérebro que estiver gerando as crises (zona epileptogênica) pode ser detectada e não se localiza numa área eloquente do cérebro (área motora ou sensitiva ou área de linguagem).
Neste caso o paciente é encaminhado diretamente para a FASE III (teste de Wada quando necessário e a cirurgia de epilepsia propriamente dita). Esta é a situação mais frequente.

2) A zona epileptogênica pode ser detectada, porém localiza-se numa área eloquente ou muito próxima a uma área eloquente do cérebro (áreas motora, sensitiva ou de linguagem)
Neste caso o paciente é encaminhado para FASE II da investigação. Porque para poder ressecar a zona epileptogênica é preciso saber com exatidão a área eloquente em questão, para não haver deficit neurológico após a cirurgia.

3) A zona epileptogênica não pode ser detectada.
Neste caso o paciente também é encaminhado para a FASE II da investigação.

FASE II

É também chamada de fase de investigação invasiva, porque usa eletrodos intracranianos, colocados pelo neurocirurgião através de uma trepanação (um pequeno orifício na calota craniana), ou através de uma craniotomia (uma abertura maior da calota craniana) sobre a região do cérebro que está sendo estudada.

Além de permitir um registro direto das atividades elétricas cerebrais e registro das crises, os eletrodos intracranianos podem ser usados para identificar as áreas eloquentes do cérebro (áreas de linguagem, dos movimentos e da sensibilidade). Este método é chamado de "mapeamento cortical":

Um neurofisiologista treinado aplica pequenas correntes elétricas que são passadas para a superfície do cérebro através dos eletrodos intracranianos e as respostas do paciente é observada (fala e compreensão no caso da testagem das áreas da linguagem e movimentos na testagem da área motora). O mapeamento cortical delimita com precisão as margens das áreas eloquentes que devem ser preservadas na cirurgia de epilepsia.

Após a colocação cirúrgica dos eletrodos, o paciente retorna á Unidade de Monitorização Contínua com Vídeo-EEG e volta a ser monitorizado como na FASE I.

Existem vários tipos de eletrodos intracranianos e a indicação de um ou outro tipo de eletrodo varia de caso para caso:

- eletrodos epidurais

- eletrodos subdurais (placas e estrias)

- eletrodos intraparenquimatosos

Após detecção da zona epileptogênica (com o mapeamento cortical quando necessário), o paciente é encaminhado para a FASE III.

FASE III

Em alguns casos realiza-se o teste de WADA (teste de amital sódico) antes da cirurgia.
O teste de Wada (Dr. Juhn Wada) consiste em realizar a cateterização da artéria carótida interna (como na angiografia cerebral habitual) e injetar um anestésico de ação e duração rápidas, chamado de amobarbital sódico, "anestesiando" desta maneira um dos hemisférios cerebrais. O paciente então é avaliado quanto à habilidade de falar, compreender e lembrar das coisas (memória). Após cessar o efeito da anestésico, o outro hemisfério é testado.

Este teste determina o hemisfério cerebral dominante para a linguagem e avalia se a memória de cada hemisfério é funcional ou não.

O teste de Wada portanto "elimina" temporariamente um dos hemisférios e permite que os médicos avaliem as funções do outro hemisfério.

O teste apresenta a vantagem de simular as possíveis consequências de uma cirurgia:

Se o objetivo da cirurgia for a ressecção da parte do lobo temporal esquerdo, ao aplicar o amobarbital na artéria carótida interna esquerda, o hemisfério esquerdo fica "anestesiado", como se tivesse sido "ressecado" pela cirurgia. Se o paciente não apresentar respostas adequadas principalmente quando testado quanto à memória, isto indicaria que o hemisfério direito (o que vai ficar depois da cirurgia) não tem capacidade suficiente para garantir uma memória adequada para o paciente após a remoção do lobo temporal esquerdo. Neste caso a cirurgia estaria contraindicada.

Em muitos casos quando a cirurgia visa às ressecções no hemisfério não dominante (como por exemplo ressecções no lobo temporal do lado não dominante) e os testes neuropsicológicos não mostrarem nenhuma disfunção no hemisfério dominante, não realizamos o teste de Wada.